sexta-feira, dezembro 23, 2005

A minha vida dava um filme do Alfred Hitchcock (pt. 3)

Quinta-feira. Saio do emprego e vou na Vespa entre o trânsito, que nesta altura e aqui perto do Centro Comercial é imenso, e sinto o telemóvel vibrar no bolso do casaco. Paro! O número é omisso. Atendo e, enquanto tiro o capacete, digo:
- "Aguarde um momento, por favor!" – sem conseguir o que dizem do outro lado.
Quando finalmente consigo atender oiço a voz da senhora da Fodicis (N.R.: Nome fictício) que está responsável pelo "meu" processo do empréstimo que nunca fiz:
- "Estou sim? Sr. Rui Gonçalves? Recepcionámos a sua exposição, porém eu tinha lhe pedido para anexar a cópia da queixa-crime que efectuou na polícia" – disse ela, bastante mais simpática.
- "Eu enviei a notificação que me foi dada pela polícia!"
- "Pois mas o Departamento Jurídico da Fodicis necessita da cópia da queixa-crime e não a notificação, Sr. Rui."
- "Peço imensa desculpa, mas isso foi tudo o que me foi dado pela polícia, mas amanhã eu irei à polícia pedir a cópia da queixa-crime."
- "Obrigado, Sr. Rui. E boa noite!"
- "Boa noite!" – grunhi entre dentes e desliguei.

Hoje de manhã dirijo-me à esquadra de polícia onde efectuei a denúncia e pergunto ao polícia se seria possível facultar-me uma cópia da queixa-crime que efectuei na segunda-feira. A resposta foi simples "Nós não fornecemos nenhuma cópia dessa espécie" - disse-me o polícia simpaticamente - "mas dirija-se à nova esquadra e aos serviços de investigação criminal e eles pode ser que lhe facultem alguma coisa desse género".

Atravesso a cidade em ante-véspera de Natal, com um trânsito caótico e chego à nova esquadra, cuja existência desconhecia e cuja existência preferia continuar a desconhecer.

Entro e explico a situação. Nisto entra um guarda da GNR. O Sr. PSP interrompe-me, pedindo desculpa e dirigindo-se ao soldado que acabou de chegar, pergunta:
- "Que deseja?"
- "Era shó pra intregar eishto! É do shenhore cumandante!" – diz o Sr. GNR esticando uma prenda de Natal.

Após a saída do Sr. GNR, volto a explicar a minha situação. Resposta: "Nós não fornecemos nenhuma cópia dessa espécie" - disse-me o polícia - "mas dirija-se aos serviços de investigação criminal, na primeira porta à direita naquele corredor, e eles pode ser que lhe facultem alguma coisa desse género".

Entro na sala dos serviços de investigação criminal, onde estão três mulheres. Uma, de frente, no computador a digitar alguma coisa, outra com um monte de papéis e a terceira, de costas, na máquina de fotocópias.
- "Bom dia!" – digo timidamente. Nada muda na sala, até que um minuto depois dão pela minha presença. Explico a situação e a senhora que estava com o molho de papéis levanta a cabeça e diz:
- "Os senhores da Fodicis sabem muito bem que nós aqui não podemos fornecer a cópia da queixa-crime, porque uma vez feita a denúncia isso entra em segredo de justiça!" – disse ela com um tom algo gelado – "Porém posso lhe passar uma declaração dizendo que a fez e em que termos a fez!"
- "Ok! Isso deve servir!" – disse eu ainda mais intimidado.
- "Qual é o número da sua queixa?" – diz ela com um tom semelhante ao da minha professora primária quando fazíamos asneiras.
E ali estive uns 10 minutos enquanto escrevia a declaração no computador. Quando acabou levantou-se e passou por mim, já esboçando um sorriso e foi pedir a assinatura do comandante.

A meio da tarde telefono para a Fodicis:
- "Fodicis ! Bom dia!" - dizem do outro lado.
- "Boa tarde! Queria falar com a senhora C. S., se faz favor!" – disse eu.
- "É cliente da Fodicis?"
- "Não sou cliente, mas infelizmente parece que sou"- disse eu. Ao que seguiu o pedido do número de contribuinte e a posterior passagem da chamada para a pessoa que está a gerir o "meu" processo.
- "Estou sim? Sr. Rui." – diz ela, toda simpática.
- "Boa tarde! Eu fui à polícia e disseram-me que os senhores já deviam de saber que eles não fornecem a cópia da queixa-crime por estar em segredo de justiça. Mas passaram-me uma declaração em como a apresentei e em que moldes o fiz."
Resposta:
- "Mas era mesmo isso que eu tinha falado!" – disse ela, enquanto eu pensava para comigo "Óbvio!".

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