quinta-feira, março 30, 2006

Há escassez de cordeiros

No sábado passado numa pequena entrevista ao Expresso, o Eng. João Picoito, CEO da Siemens Communications Portugal, diz que "há escassez de engenheiros". Aparentemente há escassez de engenheiros de software, porque "a Siemens recrutou mais de um milhar em poucos anos". "As pessoas que saem da Siemens e vão para outros desafios, têm vindo a crescer nos últimos dois anos", diz ele, ao que acrescenta "As saídas acontecem porque há falta de engenheiros com experiência no mercado".

Será que as pessoas não saem porque a Siemens não tem capacidade para as "impedir"? Eu vejo isto de outra maneira, porque as pessoas só saem se estiverem descontentes, ou com as perspectivas, com trabalho ou com o ordenado. Aliás como demonstrado por alguns estudos recentes, neste nível de emprego, as pessoas mudam menos por causa do ordenado, mas mais por causa da insegurança, falta de perspectivas e insatisfeitas com o trabalho.

E isso é explicado pela frase seguinte do Sr. Eng., quando diz que "a Siemens funciona como uma pós-graduação para recem-licenciados". Porque esse é o empregado típico da Siemens, um recém-licenciado. Mas é por opção da própria Siemens que prefere gente nova, sem experiência e que aceita facilmente o facto de estarem a trabalhar para uma empresa que presta serviços à Siemens e que esta usa (como muitas outras) para mascarar o facto de não aumentar o número de empregados, criando assim condições de insegurança e falta de perspectivas no emprego. Que aceitam salários cerca de 75% do mercado, mas porque é a Siemens as pessoas aceitam, porque a empresa tem a projecção que tem, mas que afinal só existe nos jornais e afinal tem vários problemas de conflitos internos e falta de rigor.

Eu nunca trabalhei para a Siemens ou na Siemens. Aliás fui a quatro entrevistas com esse intuito no último ano e outra ainda em 1999. Quando saio das entrevistas fico com a sensação que tudo correu bem, mas acabo sempre com uma resposta "lamentamos mas de momento não temos vagas para o seu perfil. A melhor foi que no dia em que recebi a última resposta do género um amigo, que está a trabalhar em Inglaterra, ligou-me a perguntar se não estava interessado em ir para a Siemens, que eles lhe tinham oferecido uma bolsa de um ano (11 meses, sem descontos), e ele não estava interessado.

A verdade é que eles querem pessoas sem experiência, porque essas não são exigentes com eles e saber isso é importante, mas muito redutor para uma empresa que todas as semanas sai nas notícias a dizer que irá empregar mais uma centena de engenheiros. Mas todas as semanas deve perder uma centena de engenheiros, porque é uma má empresa para se trabalhar. Como diz o Sr. Eng. na entrevista "é um preço que temos que pagar".

2 comentários:

CookieMonster disse...

Pois... Mas esses gestores da Siemens deixam um bocado a desejar. Criam uma péssima imagem da empresa, e perdem os melhores empregados... Como se costuma dizer, às vezes o barato sai caro...

Anónimo disse...

Trabalho na Siemens há mais de 10 anos e vai para 8 que eu e a maioria dos meus colegas não temos nem sequer um ajuste salarial para compensar a inflacção e nem tão pouco uma justificação para o facto. Neste hiato perdemos cerca de 30% de poder de compra, mas isto é algo que não afecta o Sr. Picoito que não se "mistura" com a massa restante dos colaboradores e até parqueia o seu BMW no meio da rua em frente à porta longe dos restantes "carneiros". Não admira portanto que muitos de nós procurem noutras paragens o que nesta casa não nos dão (salvo raras excepções). Aqui impera a política do lambe-botas e do seguidismo, que são as formas mais fáceis de trepar. Tudo misturado com um ambiente de opressão constante e censura permanente totalmente ao contrário do que apregoam. Tenho pois assistido à saída de um incontável número de colegas meus, principalmente com um ou menos anos de casa, a que corresponde um degradar constante da qualidade dos serviços que prestamos. O que se passa é muito simples: ao fim de poucos meses, e depois de adquirida uma certa prática, estes jovens são assediados pelo mercado, encontrando facilmente colocação a ganhar muitas vezes o dobro. A esta situação a empresa prefere fechar os olhos e recrutar nova fornada, marimbando-se pura e simplesmente para o facto de globalmente ir ficando cada vez mais deficitária em know how e experiência. Para além do mais, quem contrata fica a rir-se pois não tem o trabalho de dar formação a um recém-licenciado.