Já passaram 9 meses desde que aqui cheguei e já passou o
mesmo período de tempo desde que eu e o Baltasar cá estamos sozinhos. Faltam
poucos dias para entrarmos de férias e como bons emigrantes voltaremos à terrinha.
Não vamos de Mercedes, mas talvez já consigamos usar algumas palavras dos
idiomas locais no nosso normal vocabulário português.
É complicado estar longe da família e dos amigos, mas
estive o mesmo período de tempo na Califórnia e na altura não havia Raynair,
Skype ou Facebook que nos conseguisse manter mais próximos. E sobrevivi… Mas
também não havia um Sebastião! Não é sobretudo fácil estar longe dos filhos…
Mas embora pareça que foi ontem que aqui cheguei, na
verdade muita coisa se passou entretanto. Fomos umas 3 ou 4 vezes a Portugal, e
Portugal veio cá mais de uma meia dúzia de vezes. A alegria de ir à Alemanha
buscar a mãe e o irmão, mesmo que a altas horas da noite, numa sexta-feira,
contrastavam com a melancolia da partida nas segundas-feiras de madrugada. Saíamos
de lá com o nó na garganta e com um corrupio no estômago, mas nunca se verteu
uma lágrima, pois sabíamos que era assim que as coisas tinham que ser. Era um
plano complicado de implementar, mas tínhamos que ser fortes a fazê-lo.
Ajudou o facto de se ouvir todos os dias o português, nas
ruas, nos estabelecimentos comerciais ou mesmo entre amigos e muitas vezes as
saudades do país foram ultrapassadas com comida da nossa terra (enquanto
escrevo isso preparo uma caldeirada de cabrito). Recebemos a visita de amigos,
mas não havia muito tempo para cultivar amizades locais… Eu, porque o Baltasar
obviamente já tem muitos amigos.
O Baltasar já fala alemão melhor que eu, embora misture o
luxemburguês e o francês, mas essa para mim é a maior vitória destes 9 meses.
Na segunda-feira fui receber a avaliação dele e falei com as professoras dele.
Se há uns 7 meses se mostravam preocupadas com os problemas de comunicação
dele, agora quase nem falaram no facto de ele ter chegado quase dois meses
depois dos restantes colegas e falaram dele como um demais na sala de aula. Em
7 meses, apesar de momentos complicados, as crianças mostram-nos que afinal os
complicados somos nós, os adultos.
Um à-parte: Isto faz-me lembrar um episódio que me aconteceu ontem.
Parei junto a um aeródromo de aviões miniatura telecomandados porque queria
encontrar uma geocache. Nisto apareceu um tipo, parou o carro na entrada do
aeródromo (onde não estava ninguém) e dirigiu-se a mim. Senti-me intimidado,
mas ele sorriu e eu perguntei: “Do you speak english?” e ele respondeu “Only
german”. Eu perguntei, ou afirmei, “Geocaching!?” e ele sorriu e apontou-me
onde estava a cache. E cada um seguiu o seu caminho. Como as crianças…
Mas é muito normal aqui falar-se várias línguas na mesma
conversa. É normal quando na mesma mesa estamos sentados suecos, espanhóis,
luxemburgueses, belgas, franceses ou portugueses. É normal falarmos inglês,
francês, espanhol ou mesmo outras línguas pelo meio. E o sueco tem dado para
nos rirmos um bocado, porque é aquela que nos parece mais estranha (só isso
dava para uma crónica).
Desde o dia 30 de Setembro, quando cruzei a fronteira,
até agora, passaram 285 dias, 425 caches encontradas e cerca de 200 cervejas diferentes
provadas (mas ainda não consegui provar todas as variedades que existem à venda
aqui no supermercado). Houve dias melhores, e dias mais difíceis de passar,
caches mais fáceis de encontrar que outras e umas cervejas que se tornaram mais
agradáveis de degustar, que outras. Alguns dias, para além dos abraços do
Baltasar, eram as melhores coisas do mundo, principalmente em dias de neve… E
dizem os luxemburgueses que escolhemos o pior Inverno de sempre para nos
mudarmos. Espera-nos agora o resto do Verão…